Escritos Contables y de Administración, vol. 16, n.° 1, 2025, págs. 20 a 47
issn 1853-2055 (en línea)
Desafios e oportunidades na implementação da gestão por competências nas instituições federais de ensino superior
Challenges and opportunities in the implementation of competency management in federal higher education institutions
Monica Scoz Mendes1
Noemia Salete Wismann2
Marcos Baptista Lopez Dalmau3
Kelly Cristina Benetti Tonani Tosta4
Francielly Santos Teixeira5
https://doi.org/10.52292/j.eca.2025.4572
Fecha recepción: 08/12/2023
Fecha aceptación: 23/08/2024
Resumo
Este artigo analisa a implementação da Gestão por Competências nas Instituições Federais de Ensino Superior (IFES) à luz dos Decretos [D] 5707 de Presidência da República [PR] (2006) e 9991 de Presidência da República [PR] (2019). A pesquisa foi conduzida na Universidade Federal Fronteira Sul, na Universidade Federal de Santa Catarina e na Universidade Federal Rural de Pernambuco. A coleta de dados incluiu pesquisa documental e entrevistas. Sua análise foi realizada por meio do discurso. Os achados indicam que na Gestão por Competências a principal lacuna é a necessidade de estudos que aprofundem a análise dos decretos. Como contribuição à literatura, além de identificar desafios e resistências iniciais à mudança regulatória, fornece informações empíricas para a modernização da Gestão de Pessoas nas universidades federais brasileiras, considerando a relevância da valorização e desenvolvimento dos servidores para o ambiente institucional.
Palavras-chave: Decreto nº 5707/2006, Decreto nº 9991/2019, Instituições Federais de Ensino Superior (IFES), Gestão por Competências.
Abstract
This article examines the impacts of the Decrees No. 5707/2006 and No. 9991/2019 on People Management (PM) in Brazilian federal universities. The research was conducted at the Federal University of Fronteira Sul, the Federal University of Santa Catarina and the Federal Rural University of Pernambuco. Data collection involved document research and interviews, which were studied through discourse analysis. Findings show that while Competency-based Management is being implemented, challenges and resistance to change remain. It was identified that PM modernization can bring benefits and benefits and valorization of servers. The main gap observed is the need for studies that deepen the analysis of the impacts of decrees. As a contribution to the literature, it is intended to provide empirical information to enable the modernization of PM in Brazilian federal universities.
Keywords: Decree No. 5707/2006, Decree No. 9991/2019, Federal Institutions of Higher Education, Competency-based Management.
JEL: M10, M12.
1. Introdução
Na contemporaneidade, instituições públicas federais são fortemente impactadas por mudanças que requerem desenvolvimento de estratégias que concorram na adaptação de cenários dinâmicos. Diversas são as transformações para que essas instituições redefinam novos papéis, boa parte deles inseridos pela ideia de nova gestão pública na busca da eficiência, eficácia e efetividade dos serviços (Do Canto et al., 2023).
No sentido de modernizar e democratizar sua gestão, instituições públicas federais buscam alinhar seu planejamento estratégico ao mapeamento de competências de servidores, além de desenvolver, monitorar e avaliar ações visando progresso. A moderna estrutura exige tanto adaptações institucionais quanto operacionais. É notório que, para conquistar uma gestão integrada e sistêmica, a administração pública federal adota o desenvolvimento de pessoas por competências - Gestão por Competências - demandando Instituições Federais de Ensino Superior (IFES) lidar com situações complexas do ambiente público e desenvolvendo servidores nas competências necessárias para execução de novas atribuições (Dutra et. al., 2019; Dalmau et al., 2022; Do Canto et al., 2023).
A partir da caracterização de determinado cargo institucional, procura-se atender a mecanismos de desenvolvimento de competências baseado em três dimensões - conhecimentos, habilidades e atitudes (CHA), visando melhor qualificação de servidores, como também alcance de ações e objetivos institucionais. O uso desses mecanismos contribui na formação de servidores cujas competências vão ao encontro das requeridas para o exercício da função. Integradas ao planejamento estratégico, contribuem para transformação das vertentes de valores institucionais e culturais (De Freitas e Odelius, 2018; Dalmau et al., 2022).
Na administração pública federal direta, autárquica e fundacional, a Gestão por Competências foi introduzida por intermédio do D 5707 de PR (2006) Decreto nº 5707, de 23 de fevereiro de 2006 (Brasil, 2006), trazendo a proposição de política e diretrizes para o desenvolvimento de pessoal - Política Nacional de Desenvolvimento de Pessoas (PNDP). Deu destaque para a capacitação de servidores públicos em geral, regulamentando dispositivos (Lei 8112, 1990). Em 2019, no intuito de atender ao atual D 9991 de PR (2019) Decreto nº 9991, de 28 de agosto de 2019, diretrizes do PNDP foram alteradas a fim de promover o desenvolvimento de servidores públicos de acordo com competências necessárias à consecução da excelência na atuação dos órgãos e das entidades da administração pública federal.
Embora a Gestão por Competências seja uma abordagem habitualmente utilizada para a modernização da Gestão de Pessoas em IFES, lacunas foram observadas na transição do Decretos (D 5707 de PR, 2006) para o (D 9991 de PR, 2019), na efetividade da Gestão por Competências em IFES especialmente no que diz respeito à identificação das competências necessárias para o desempenho das atividades acadêmicas e administrativas, bem como a falta de um instrumento que permita medir com exatidão necessidades de capacitação e ausência de processos de Gestão de Pessoas que possibilite seguir, com precisão, regras do decreto.
Posto isso, considerando a publicação do D 9991 de PR (2019) e seus reflexos na Política Nacional de Desenvolvimento de Pessoas da Administração Pública Federal, o objetivo para a condução da pesquisa apresentada neste artigo é analisar a implementação da Gestão por Competências nas Instituições Federais de Ensino Superior (IFES) à luz do D 5707 de PR (2006) e D 9991 de PR (2019). Para tanto, realizou-se uma comparação entre eles e entrevistas com gestores institucionais, seguidas de uma análise das potenciais implicações no desenvolvimento de servidores públicos federais das IFES pesquisadas.
As contribuições deste estudo visam fornecer insights sobre a transição legislativa na Gestão de Pessoas nas IFES identificando desafios e oportunidades para a modernização e aprimoramento contínuo desse processo. Espera-se que resultados obtidos possam subsidiar gestores e tomadores de decisão na formulação de políticas e práticas eficazes de desenvolvimento de pessoal, alinhadas às necessidades e demandas das instituições de ensino superior.
Este artigo está estruturado em quatro seções principais. Na primeira, é apresentada uma fundamentação teórica sobre Gestão por Competências, contextualizando conceitos-chave e as diretrizes do D 5707 de PR (2006) e D 9991 de PR (2019). Em seguida, a metodologia da pesquisa é detalhada, descrevendo a abordagem qualitativa adotada, os procedimentos de coleta e análise de dados, bem como o perfil de participantes. A terceira seção aborda os resultados da análise, destacando os principais achados em relação à implementação da Gestão por Competências nas IFES e os desafios identificados. Por fim, a quarta seção apresenta considerações finais, discutindo contribuições do estudo, suas limitações e sugestões para pesquisas futuras.
2. Fundamentação teórica
Nesta seção, apresentam-se as bases teóricas nas quais se fundamentou esta pesquisa, a saber: Gestão por Competências, o D 5707 de PR (2006), o D 9991 de PR (2019). Ainda, discute-se conceitos gerais para contextualizá-los no âmbito de organizações públicas e IFES
2.1. Gestão por competências
Competência é a palavra chave de todo desenvolvimento. Sua origem remete ao latim competem tia e significa a “qualidade de quem é capaz de apreciar e resolver certo assunto, capacidade de fazer determinada coisa, habilidade, aptidão, idoneidade e nível de produtividade” (Ferreira, 1999, p. 42). O desenvolvimento de competências depende de ação individual e coletiva (Dalmau et al., 2022).
Ao pensar em competência, é necessário compreendê-la como um conceito político educacional abrangente. Um processo de articulação e mobilização gradual e contínua de conhecimentos gerais e específicos, de habilidades teóricas e práticas, de hábitos e atitudes e de valores éticos que capacite o indivíduo no exercício eficiente, eficaz e efetivo de sua atividade, na sua participação ativa, consciente e crítica no mundo do trabalho e na esfera social, além da autorrealização (Deluiz, 2001; Fleury e Fleury, 2004)
Ao partir do princípio básico, a literatura clássica de Gestão de Pessoas caracteriza competência como um conjunto de requisitos - saberes, conhecimentos, aptidões, habilidades - indicados à condição de produzir efeitos, resultados e/ou soluções de problemas (McClelland e Dailey, 1972). Em linhas gerais, a definição é baseada no CHA - conjunto de (i) conhecimentos (formação acadêmica do indivíduo); (ii) habilidades (prática, experiência e domínio do conhecimento); e (iii) atitudes (emoções, valores e sentimentos). Seu gerenciamento auxilia na direção de esforços para planejar, desenvolver e avaliar talentos em diferentes níveis da organização. Compreendida também como o conjunto de aptidões comportamentais (atitude) e técnicas (conhecimentos) (Do Canto et al., 2023).
A Gestão por Competências surgiu para materializar conceitos e transformá-los em estratégias organizacionais. Atua na busca de vantagem competitiva a fim de atender rápida e eficientemente interessados - indivíduos e organização, com base em uma abordagem teórica integradora, frente ao cenário atual de mudanças constantes, de necessidade crescente por inovação tecnológica e, principalmente, pela adequação a ambientes. Como resultado, o reconhecimento da instituição (Alles, 2016; Do Canto et al., 2023).
Sua prática é mecanismo que envolve o alinhamento entre recursos humanos e planejamento estratégico, enfatizando pessoas como recurso diferencial para o bom desempenho institucional (Avelino et al., 2016; Cerutti, 2017). Considerada parte do sistema organizacional, direciona ações para o desenvolvimento contínuo de competências necessárias a atingir objetivos individuais e institucionais do processo de aprendizagem e avanço funcional (Do Canto et al., 2023). Na Administração Pública Federal, um arcabouço legal, atualmente fundamentado pelo D 9991 de PR (2019), regulamenta a Gestão por Competências para o desenvolvimento de servidores nas competências necessárias para a excelência na prestação do serviço público.
2.2. O Decreto nº 5707, de 23 de fevereiro de 2006
Em um cenário de desenvolvimento de pessoas, o D 5707 de PR (2006), que instituiu a Política Nacional de Desenvolvimento de Pessoal (PNDP) cujo foco estava na construção de um modelo de Gestão de Pessoas orientado por competências (Silva, 2018), regulamentou a gestão de capacitação envolvendo o conjunto de conhecimentos, habilidades e atitudes necessárias ao desempenho das funções de servidores (D 5707 de PR, 2006, art., 2, Inciso II). O modelo era voltado basicamente para o processo de aprendizagem (Silva, 2018).
O D 5707 de PR (2006), que era o documento que formalizava os trâmites burocráticos da Gestão por Competências dentro de IFES, tinha como objetivo principal atender às exigências e atribuições dispostas nos Arts. 87 da Lei nº 8112, de 11 de dezembro de 1990. A referida Lei (Lei 8112, 1990, p. 6) destaca que “após cada quinquênio de efetivo exercício, o servidor poderá, no interesse da Administração, afastar-se do exercício do cargo efetivo, com a respectiva remuneração, por até três meses, para participar de curso de capacitação profissional”.
Ainda, em seu Art. 102, incisos IV e VII (Lei 8112, 1990, p. 7), descreve que são considerados como de efetivo exercício os afastamentos em virtude de participação em programa de treinamento regularmente instituído ou em programa de pós-graduação stricto sensu no País, conforme dispuser o regulamento ou missão ou estudo no exterior, quando autorizado o afastamento, conforme dispuser o regulamento.
O D 5707 de PR (2006), por sua vez, determinava, como critérios de afastamentos para capacitação, a adequação das escolhas de qualificação aos objetivos das instituições, tendo como referência o Plano Plurianual, além de melhorias na eficiência, eficácia e qualidade dos serviços públicos prestados. Além disso, regulamentava instrumentos da PNDP, como o Plano Anual de Capacitação, o Relatório de Execução do Plano Anual de Capacitação e o Sistema de Gestão por Competência. O eixo do referido decreto era na capacitação do servidor público.
Apesar de relativamente antigo, atualmente, organizações públicas brasileiras ainda enfrentam dificuldades na implantação de um sistema de Gestão por Competências. No caso das Universidades, a complexidade em adaptar-se é uma barreira a ser enfrentada. Fatores como natureza dos serviços e suas especificidades, diferentes cargos e funções, alto número de servidores, constantes mudanças nas políticas administrativas e pedagógicas dificultam a implementação de um sistema por competências.
Em vista disso, a partir da necessidade de transformar o cenário organizacional da esfera pública, o D 5707 de PR (2006) foi revogado no dia 28 de agosto de 2019 com o intuito de maximizar resultados do PNDP. Portanto, fez-se necessário estabelecer um novo decreto.
2.3. O Decreto nº 9991, de 28 de agosto de 2019
Atualmente, no serviço público federal, a Gestão por Competências é regulamentada pelo Decreto (D 9991 de PR, 2019), com alterações realizadas pelo Decreto [D] 10506 de Presidência da República [PR] (2020). Além dos decretos, há regulamentações na Instrução Normativa (IN) nº 201, de 11 de setembro de 2019, do Ministério da Economia (ME), que dispõe sobre critérios e procedimentos específicos para a implementação da PNDP pelos órgãos integrantes do Sistema de Pessoal Civil da Administração Federal (SIPEC).
Tanto os Decretos D 9991 de PR (2019) e D 10506 de PR (2020) quanto a referida IN regulamentam o ato administrativo e estabelecem que instituições públicas federais atendam a novos critérios estabelecidos por meio do PNDP, demandando aperfeiçoamento de competências de servidores. Sua relação com a área de Gestão de Pessoas prevê mapeamento de competências requeridas ao cargo/função das instituições e elaboração de formas para identificar e desenvolver competências centrado no cargo/função pública, não apenas como processo de aprendizagem, mas um processo de desenvolvimento funcional específico, contínuo e integrado (De Moura et al. 2020).
O D 9991 de PR (2019, p. 7), alinhado à Lei 8112 (1990), estabelece, em seu Art. 18, os afastamentos para participação em ações de desenvolvimento, a saber: I – licença para capacitação; II – participação em programa de treinamento; III – participação em programa de pós-graduação stricto sensu no País; e IV - realização de estudo no exterior.
Os referidos afastamentos são atribuídos a participação em ações de desenvolvimento considerando o interesse público e o desenvolvimento/aquisição de habilidades necessárias ao exercício das atribuições de seu cargo/função (D 9991 de PR, 2019).
O Art. 19 apresenta critérios de afastamento para ações de desenvolvimento também previstos no PNDP do órgão ou entidade do servidor, alinhados ao desenvolvimento das competências relativas (ao exercício/lotação), à carreira ou cargo efetivo, ou ao cargo em comissão ou função de confiança, além da ação de desenvolvimento ser realizada sem afetar o cumprimento da jornada de trabalho (D 9991 de PR, 2019).
O D 9991 de PR (2019) tem como eixo o aumento da produtividade dos setores, redução de custos, desperdícios e rotatividade do pessoal e favorecer qualidade do serviço prestado. O objetivo é conduzir a estratégia organizacional da esfera pública espelhados aos princípios da esfera privada - visando à maximização dos recursos e do potencial humano com treinamento constante, assegurando que o treinamento requerido seja orientado para satisfazer as necessidades da instituição (Deming, 1990).
2.4. Decreto nº 5707/2006 versus Decreto nº 9991/2019
De forma a complementar o antigo D 5707 de PR (2006), o qual visava desenvolver única e objetivamente habilidades, competências e atitudes do servidor público, o D 9991 de PR (2019) inclui novas diretrizes aos modelos de Gestão Pública, priorizando critérios antes não exigidos.
Conforme descreve seu Art. 1º, sobre objeto e âmbito de aplicação (D 9991 de PR, 2019, p.1):
Art. 1º Este Decreto dispõe sobre a Política Nacional de Desenvolvimento de Pessoas - PNDP, com o objetivo de promover o desenvolvimento dos servidores públicos nas competências necessárias à consecução da excelência na atuação dos órgãos e das entidades da administração pública federal direta, autárquica e fundacional.
Segundo diretriz funcional, o D 9991 de PR (2019, p. 1) elenca quais ações devem ser desenvolvidas em finalidade a atender ao PDP:
Art. 3º Cada órgão e entidade integrante do SIPEC elaborará anualmente o respectivo PDP, que vigorará no exercício seguinte, com a finalidade de elencar as ações de desenvolvimento necessárias à consecução de seus objetivos institucionais.
§ 1º O PDP deverá:
§ 2º A elaboração do PDP será precedida, preferencialmente, por diagnóstico de competências.
§ 3º Para fins do disposto neste Decreto, considera-se diagnóstico de competências a identificação do conjunto de conhecimentos, habilidades e condutas necessários ao exercício do cargo ou da função.
As diretrizes se baseiam no aprimoramento do servidor efetivo em benefício da organização/instituição e ao referido cargo/função e a política norteadora da PNDP fundamentada nos princípios de especialidade e maximização do potencial individual do servidor. Para tanto, consoante aos propósitos da organização/instituição, atendendo necessidades do cargo/função.
O desafio estabelecido à Administração Pública, mais do que a apropriação do conceito de competência, é transformar estruturas burocráticas e hierarquizadas, que, com o atual decreto, tendem a acentuar um processo de engessamento, em instituições flexíveis e empreendedoras. Com a implementação, o confronto da base fundamental da abordagem de competência, do desenho de cargos e do conceito dinâmico de habilidades e competências necessárias ao cumprimento da missão da instituição é atividade complexa de gestores atuantes em Gestão de Pessoas em IFES. Estas, constituídas como organizações sociais plurais, buscam na Gestão por Competências proximidade aos administrados e entregar resultados sociais inquiridos. Procuram constituir forma de gestão flexibilizadas e garantia de celeridade aos processos decisórios e gerenciais, como também transmitir eficiência, eficácia, efetividade e economicidade ao cenário ambíguo e imprevisível da gestão institucional pública (Dalmau et al., 2022).
Após análise comparativa, destaca-se mudanças advindas do atual D 9991 de PR (2019), como critérios de economicidade explicitamente descritos e ênfase no desenvolvimento do servidor como parte indissociável ao cargo/função. Infere-se a importância dos princípios constitucionais considerados fundamentais na garantia de legitimidade das atividades estatais - legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade (transparência) e eficiência no ato administrativo e no uso dos recursos públicos. Isto posto, devido às especificidades, o atual decreto sugere maior controle interno e externo dos atos administrativos (Constituição da República Federativa do Brasil (CRFB) da PR, 1988; De Mello, 2014).
Na tabela 1, faz-se um comparativo entre decretos estudados.
Tabela 1. Comparativo Decreto n.º 5.707/2006 versus Decreto nº 9.991/2019
Aspectos avaliados |
Decreto n.º 5707/2006 - revogado |
Decreto n.º 9991/2019 - atual |
Premissas/Princípios |
Desenvolvimento de competências requeridas àquelas necessárias ao alcance dos objetivos e resultados da administração pública. |
Alinhar necessidades de desenvolvimento com a estratégia da instituição. |
Diretrizes |
Incentivar e apoiar o servidor público em suas iniciativas de capacitação voltadas para o desenvolvimento das competências institucionais e individuais. |
Promover o desenvolvimento de servidores públicos nas competências necessárias à consecução da excelência na atuação dos órgãos e das entidades da administração pública federal direta, autárquica e fundacional. |
Entidades Promotoras |
IES e Escolas de governo |
Escolas de governo |
Requisitos para Afastamentos |
Flexíveis |
Complexos |
Quantitativo de servidores que usufruirão a licença |
Sem limitação |
5% dos servidores em exercício na instituição. |
Controle |
Descentralizado, maior autonomia para as IES |
Centralizado, menor autonomia para as IES. |
Fonte: elaborado pelos autores com base em Brasil (2006) e Brasil (2019).
3. Procedimentos metodológicos
A pesquisa tem como escopo a análise da Gestão por Competências em relações institucionais de planos individual (servidor/gestor) e coletivo (IFES) em um dado contexto de transformações decorrentes de alterações da legislação que versa o tema.
No intuito de compreender opiniões e impressões dos sujeitos, o presente estudo foi realizado com base na metodologia de Saunders et al. (2009) - The Research Onion. A proposta baseada na ferramenta foi composta por: filosofia da pesquisa, o construtivismo, possibilitando interpretações de experiências empíricas; abordagem do estudo, a dedutiva devido a busca pela generalização e observação do cenário; escolha metodológica, pesquisa qualitativa; propósito do estudo, exploratório e descritivo; e estratégia baseada em pesquisa documental e análise do discurso (Bakhtin, 1979; Saunders et al., 2009; Brandão, 2012).
Foram definidas as seguintes IFES atuantes no país: (i) Universidade Federal Fronteira Sul (UFFS); (ii) Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC); e (iii) Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE). A seleção das Instituições Federais de Ensino Superior (IFES) participantes neste estudo foi realizada por conveniência, levando em consideração sua disponibilidade e acessibilidade para colaborar com a pesquisa. Foram escolhidas devido à sua representatividade no cenário acadêmico nacional e à diversidade de contextos que poderiam oferecer insights relevantes para a análise da implementação da Gestão por Competências. Quanto aos entrevistados, a seleção foi baseada na identificação de gestores atuantes nas respectivas pró-reitorias ou diretorias de Gestão de Pessoas das Instituições com cargos de liderança e conhecimento aprofundado sobre as práticas de Gestão de Pessoas nas instituições. Embora a seleção por conveniência tenha sido adotada para facilitar acesso aos participantes, ressalta-se que os critérios de seleção foram orientados pela relevância e expertise dos entrevistados para contribuir significativamente com as discussões e análises propostas neste estudo. Para coleta de dados primários, a partir do encaminhamento de convite para a pesquisa seguido de conteúdo conceitual a fim de contextualizar a temática abordada no estudo, foram realizadas cinco entrevistas em profundidade guiadas por roteiros semiestruturados (Marconi e Lakatos, 2007) no período compreendido entre 2019 e 2020. Nessa etapa de investigação, optou-se pela escolha de participantes que mais se apresentavam inteirados acerca das práticas de Gestão de Pessoas, também escolhidos por conveniência.
A coleta de dados secundários por meio dos decretos apresentados forneceu informações relevantes para a contextualização das análises, bem como corroboram e aumentaram a evidência da fonte primária (Saunders et al., 2009). A utilização de fonte primária e secundária possibilitou a triangulação dos dados, bem como forneceu credibilidade e confiabilidade aos resultados tornando as constatações mais sólidas e sustentadas. Além disso, possibilitou a apreensão de uma dada realidade sob diversos ângulos, permitindo o confrontamento de informações, de maneira a minimizar vieses resultantes de uma única perspectiva de análise (Bryman, 2008; Santos et. al., 2020).
O procedimento metodológico foi realizado em três etapas:
a. Etapa I: Pesquisa Documental
Realizada segundo análise do D 5707 de PR (2006) e D 9991 de PR (2019) e principais aspectos de mudanças no intuito de conhecer alterações nos textos e possíveis impactos a gestão das IFES estudadas.
b. Etapa II: Entrevista
As entrevistas foram utilizadas para cotejar a percepção dos gestores com dados apurados na análise documental, visando identificar impactos relevantes à instituição (Brandão et al., 2002). Para tanto, cinco gestores foram entrevistados, identificados como Sujeito 1 (S1), Sujeito 2 (S2), Sujeito 3 (S3), Sujeito 4 (S4) e Sujeito 5 (S5). Buscou-se compreender atividades organizacionais, mudanças gerenciais requeridas, bem como as necessárias para o desempenho das ações do atual decreto.
A tabela 2 sintetiza a relação entre objetivos do estudo, sujeitos de pesquisa e procedimento de coleta de dados.
Tabela 2. Relação entre os objetivos e a coleta de dados
Objetivos específicos |
Sujeitos |
Coleta de dados |
Analisar Decreto nº 5707/2006 e Decreto nº 999/2019 |
Decreto nº 5707/2016 e Decreto nº 9991/2019 |
Documental |
Comparação entre decretos |
Decreto nº 5707/2016 e Decreto nº 9991/2019 |
Documental |
Visão de gestores - IES |
Gestores |
Entrevista |
Realizar diagnóstico dos Pontos Positivos e Negativos do Decreto nº 9991/2019 |
Gestores |
Entrevista |
Mudanças ocorridas |
Gestores das IES |
Entrevista |
Fonte: elaborado pelos autores.
c. Etapa III: Análise dos dados
As análises das evidências obtidas na coleta de dados consistiram em examinar, categorizar e classificar, tendo em vista conceitos previamente apresentados. Foram realizadas análises individuais de documentos e entrevistas. A discussão final foi fundamentada na literatura abordada, além de diretrizes identificadas nos decretos. Tal procedimento, forneceu condições de avaliação dentro dos padrões metodológicos associados aos objetivos definidos, contribuindo com o robustecimento da metodologia e elevação da amplitude do estudo, portanto, oferecendo suporte às interpretações (Marconi e Lakatos, 2007).
A análise dos dados coletados indicou a abrangência da Gestão por Competências sob perspectivas institucional. A ideia de buscar a via institucional das IFES justifica-se por propiciar dimensão do escopo das competências neste estrato e um cenário amplamente complexo para a aplicação das atuais vertentes do decreto. Para tratamento dos dados coletados, optou-se por analisar entrevistas a partir do discurso dos entrevistados identificando impactos na Gestão de Pessoas nas IFES provenientes da mudança do decreto.
Ademais, faz-se necessário ressaltar o contexto em que a presente pesquisa foi realizada, uma vez que este possui profunda relação com resultados obtidos. As entrevistas foram realizadas durante o período de pandemia pelo Coronavírus, decretado pelo Governo Federal, em 20 de março de 2020 (D 6 da PR, 2020). A ocasião deve ser considerada visto que o atual decreto havia sido publicado meses antes do início da paralisação das atividades, ou seja, tempo restrito para a efetiva prática presencial dos seus efeitos junto ao público atendido.
4. Análise dos resultados
Nesta seção, apresenta-se inicialmente o histórico e estrutura das IFES pesquisadas, a fim de contextualizar unidades analisadas dentro deste estudo. Na sequência, busca-se apresentar a temática e o resgate dos objetivos, bem como resultados encontrados por meio da pesquisa.
4.1. Instituições e gestão por competências nas IFES
A Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS) tem seis campi: Chapecó (SC) – sede da Instituição, Realeza e Laranjeiras do Sul (PR), Cerro Largo, Erechim e Passo Fundo (RS) e conta com um total de 1.376 servidores, entre professores do magistério superior e técnicos-administrativos em educação.
Cabe à Pró-Reitoria de Gestão de Pessoas (PROGESP), vinculada à Reitoria, órgão executivo da Administração Superior, gerir seu quadro funcional. De acordo com o Art. 23 do Regimento Geral da UFFS, aprovado pela Resolução nº 3/2016 – CONSUNI, possui seguintes competências ((Resolução [R] 3 de Conselho Universitário [CONSUNI], 2016):
Compete à PROGESP da UFFS acompanhar exercício funcional dos servidores, formação, avaliação, dimensionamento e desenvolvimento das carreiras no âmbito da Universidade (R 3 de CONSUNI (2016).
Para atender ao D 9991 de PR (2019), a UFFS realiza levantamento da necessidade de desenvolvimento, seguido da análise e aprovação da PROGESP. Todas as solicitações priorizam cursos promovidos por Escolas de Governo, se existam escolas que tratam de capacitações na área requisitada e execução de capacitações no ambiente da UFFS (R 3 de CONSUNI (2016).
A Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC, 2023) conta com cinco campi: Florianópolis, Araranguá, Blumenau, Curitibanos e Joinville e possui um total de 5.660 servidores, entre professores do magistério superior/educação básica e técnicos-administrativos (UFSC, 2023).
A Pró-Reitoria de Desenvolvimento e Gestão de Pessoas (PRODEGESP), por meio das unidades, possibilita aos servidores da carreira a potencialização como agentes sociais institucionais, projetando o fortalecimento das atividades de ensino, pesquisa, extensão e gestão universitária, bem como melhor nível de qualidade de vida no trabalho (UFSC, 2023).
Compete à PRODEGESP (UFSC, 2023):
A referida Pró-Reitoria é responsável por realizar o Levantamento de Necessidades de Desenvolvimento (LND), etapa inicial da elaboração do Plano de Desenvolvimento de Pessoas (PDP). Este processo consiste em diagnosticar necessidades de desenvolvimento de equipes e demandas por qualificação e aperfeiçoamento. Após, são realizadas etapas de Validação de Necessidades, classificadas de acordo com a frequência em que ocorrem e o nível de resultado esperado. A etapa final compreende análise e priorização de necessidades com o objetivo de consolidar e priorizar necessidades validadas na etapa anterior, tendo como base os objetivos institucionais (UFSC, 2023).
A Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE) tem sede em Recife (PE) e Unidades Acadêmicas em Serra Talhada (UAST), Cabo de Santo Agostinho (UACSA), Belo Jardim (UABJ), além de Educação a Distância (UAEADTec). É composta por mais de 1.200 professores e mais de 1.000 técnicos-administrativos (UFRPE, 2023).
À Pró-Reitoria de Gestão de Pessoas (PROGEPE) compete elaborar e implementar planos, programas e projetos de redimensionamento organizacional, avaliação de desempenho, desenvolvimento de competências, apoio psicossocial, saúde ocupacional, controle remuneratório e movimentação de pessoal (UFRPE, 2023).
Conforme Resolução [R] 90 de Conselho Universitário [CONSU/UFRPE] (2021), Art. 2º, a PROGEPE tem por finalidade:
Por meio da Resolução [R] 160 de Conselho Universitário [CONSU/UFRPE] (2022) Resolução CONSU/UFRPE Nº 160, de 14 de fevereiro de 2022, foi instituída a Política de Gestão de Pessoas por Competências no âmbito da UFRPE, considerada modelo de auxilio no gerenciamento e desenvolvimento das habilidades técnicas e comportamentais dos profissionais no sentido de propiciar conexão entre estratégias institucionais e o corpo funcional.
A Política de Gestão de Pessoas por Competências da UFRPE define competências, modelo de gestão, realização de concurso e seleção pública, reposição de servidores, identificação de perfis, análise e tratamento de vagas, movimentação interna e externa, mapeamento da força de trabalho, mapeamento das competências, identificação e tratamento das ocupações críticas, avaliação de desempenho, capacitações e qualificações, designação para cargos de direção e funções gratificadas e critérios de qualidade de vida no trabalho (UFRPE, 2023).
4.2. Discussão dos resultados
A partir da análise do discurso (Bakhtin, 1979; Brandão, 2012), a Gestão de Pessoas por Competências é positivamente influenciada pelo gestor designado para o exercício da função. Segundo participantes da pesquisa, o ideal é alocar ao cargo um profissional capacitado com experiências voltadas à Gestão por Competências, geralmente inviável devido ao modelo de seleção de órgãos públicos.
Traçando uma linha histórica sobre as instituições estudadas, desde a implantação do primeiro decreto, em 2006, houve esforço em organizar ações definidas na referida norma, tanto na estruturação de setor específico quanto na emissão de normativas internas que regulamentaram atividades. Entretanto, tem-se a ideia que exista uma acentuada lacuna entre ação e narrativa do decreto. Para entrevistados, geralmente se prioriza a regulamentação das formas de afastamento e não a gestão por competências em si. Fato que, segundo participantes, persiste com a implementação do atual decreto.
Como ilustração, importante destacar discurso que afirma que a publicação do D 5707 de PR (2006) representou um marco importante para a carreira do servidor público do executivo federal, pois não havia diretrizes para nortear ações. Segundo sujeito 2, foi com o seu surgimento que a universidade se organizou (S2):
É claro que o decreto tinha pontos a serem melhorados e situações que não estavam contempladas, porém contribuiu para uma mudança na forma da Progressão na Carreira com regras estabelecidas, critérios de tempo de serviço e avaliação funcional. O decreto possibilitou a elaboração de um plano de gestão, com o objetivo de desenvolvimento profissional. Possibilitou à gestão construir um corpo de pessoal qualificado e, naquele momento, isso foi importante (S2).
O sujeito 1 corrobora com o discurso:
Trouxe uma nova forma de gestão (…) Antes não existia política de desenvolvimento de pessoas. Penso que o decreto (D 5707 de PR, 2006) veio marcar o próprio desenvolvimento necessário para a preparação do servidor público e para novos. Isso foi um ganho em linhas de desenvolvimento. A forma como se apresentou, possibilitou universidades agir com autonomia principalmente na elaboração do plano anual de capacitação. Trouxe liberdade por meio de levantamento das necessidades de treinamento e de construir um plano com as especificidades do que era necessário para a formação de servidores em suas atividades (S10).
O sujeito 4 coloca à discussão outros pontos positivos, como linhas de desenvolvimento e possibilidade de formação de um plano ou programa de capacitação direcionado ao atendimento das competências de servidores. O discurso do sujeito 1 vai ao encontro dessa temática, pois afirma que o antigo decreto permitia o desenvolvimento de forma plena, bem como ampla interpretação, seja do servidor ou da instituição. Para sujeito 1, “O D 5707 de PR (2006) não engessava o processo de desenvolvimento. Tinha-se grande liberdade de atuação, mas não foi utilizado corretamente pelas instituições e acarretou novas restrições presentes no atual decreto (S1)”.
Por outro lado, ainda que flexível, importante e regulatório, o D 5707 de PR (2006) mostrou-se falho em alguns pontos, como ressalta o sujeito 3:
Por ser amplo, cada instituição fazia de forma diferente. A legislação era genérica e não especificava como realizar o processo. Os gestores ficavam responsáveis pelas decisões, pois não apresenta claramente as diretrizes. Por exemplo, a dificuldade de implantar a Gestão por Competências. O antigo decreto descreve competências, mas não dá diretriz de como fazer, de como instituir, nem tampouco um direcionamento. Dimensionamento é outro ponto que o antigo decreto apontava e não conseguimos evoluir. Considero esses pontos negativos (S3).
Ao ampliar a discussão, vê-se que outros contraproducentes foram levantados pelos entrevistados, principalmente quanto ao antigo decreto, uma vez que puderam trabalhar com ele por mais tempo, observados nos seguintes discursos: “O D 5707 de PR (2006) deixava interpretações dúbias. A lei não estava clara em algumas situações, o que acabava gerando dúvidas e consulta a procuradoria e demais órgãos consultivos (S3, S4 e S5)”; “A universidade criou uma resolução com o objetivo de institucionalizar normas e diretrizes de forma a auxiliar sua prática. A ferramenta institucionalizou todas as diretrizes, bem com serviu para a própria organização do setor (S2)”.
Falta um instrumento que permita medir com exatidão as lacunas e necessidades de capacitação. Não basta somente ter um decreto que as regularize. Não há, de forma efetiva, um processo de Gestão de Pessoas que possibilite seguir com exatidão as regras do decreto. Penso que é um problema institucional de adaptação e por isso, uma desvantagem. O ideal é existir um instrumento adequado de medição de gaps/lacunas para contribuir no desenvolvimento da área de Gestão de Pessoas. Como profissional, sinto necessidade de um modelo a ser seguido. Sugiro um modelo padronizado para a identificação dessas lacunas (S1).
Com a publicação do D 9991 de PR (2019), que revogou o antigo, as instituições estudadas tiveram que se adaptar às novas exigências demandando decisões rápidas e práticas, segundo discurso de sujeitos:
Recebemos com grande surpresa o novo decreto. Nossa reação foi de desconhecimento total! Um documento homologado sem participação e discussão de interessados que executam os processos na área de Gestão de Pessoas. A partir da publicação, tivemos nove dias para implementá-lo. Nossa equipe fez reuniões. Alteramos formulários. Conversamos e encaminhamos as atividades. Foi no decorrer do processo que aconteceu o aprendizado. O governo também realizou lives para tirar dúvidas das instituições (S5).
Devido aos prazos de implementação serem curtos, ficamos preocupados de como colocar em prática as exigências impostas no decreto, pois não tínhamos conhecimento de todas as regras. Tivemos um mês para criar o PDP e isso resultou em estresse dentro do setor, pois não sabíamos como fazer; mas com a maturidade do entendimento, foi possível a regularização das atividades. As maiores dificuldades foram sobre afastamentos, porque na visão do governo, servidor afastado é custo e não investimento. Inclusive, nas reuniões que participamos com o Ministério da Educação é assim que eles falam (S2).
Em linhas gerais, segundo discurso dos entrevistados, pode-se ver também que há pontos positivos nessa mudança, como a oferta cursos básicos pela ENAP, reduzindo cursos em duplicidade (instituições e escolas do governo) e, consequentemente, redução de custos e otimização de recursos (S4). Outro ponto positivo, a possibilidade de maior planejamento e afastamentos, surgindo a necessidade de planejar a partir do PDP oferecendo protagonismo à Gestão de Pessoas, bem como permitindo que realize o controle do pessoal afastado para capacitação (S2).
Ainda, outro aspecto positivo do atual decreto, segundo discurso de S1, a restrição dos 2% pode ser positiva em relação à minimização de gastos, além da otimização das tarefas, uma vez que capacitações passam ser alinhadas ao cargo.
Referente aos impactos provenientes da mudança dos decretos, o discurso dos gestores expressou posicionamentos consonantes ao afirmar que a principal consequência foi o forte engessamento das ações de capacitação, limitando o desenvolvimento do servidor e a autonomia das instituições na oferta de cursos. Segundo entrevistados, o atual decreto foi uma imposição do governo que feriu a capacidade formativa das instituições, criando situações que dificultam a possibilidade do servidor se desenvolver e se qualificar.
O discurso do S1 reforça essa percepção ao relatar que “sigo afirmando que não vejo vantagens no atual decreto e afirmo o engessamento do servidor perante requisitos requeridos. No caso da produtividade, vai depender do próprio gestor, suas habilidades e maneira como conduzirá a implantação (S1).
De acordo com S1, a publicação do atual decreto aumentou a necessidade de criar uma ferramenta que permita a padronização de um método de gestão para alcançar objetivos, cabendo ao gestor conduzi-lo de forma eficiente, considerando as políticas da instituição.
Por fim, após análise dos discursos (Bakhtin, 1979; Brandão, 2012), cabe destacar que o atual decreto, publicado em 2019 e atualmente utilizado pelas IFES em todo Brasil, ainda demanda período para efetiva avaliação e desenvolvimento por conta do cenário atípico que se originou, na pandemia mundial provocada pelo vírus denominado Covid-19, suspendendo a aplicação do decreto em todas as faces. Inclusive, considerado uma limitação do presente estudo, uma vez que entrevistas foram realizadas no período pandêmico, e a referida normativa havia recém sido emitida, portanto, sem tempo hábil para instituições implementarem na prática.
Destaca-se que os referidos decretos são apenas documentos complementares que regularizam o exercício da função, permitindo interpretação da situação e discricionariedade no momento da implementação.
4.3. Críticas e futuros caminhos
O D 9991 de PR (2019) revogou o D 5707 de PR (2006), resultando alterações quanto ao Plano de Desenvolvimento de Pessoas – PDP, bem como estabelecendo regras relativas ao Relatório Anual de execução do PDP, o Plano Consolidado de Ações de Desenvolvimento e o Relatório Consolidado de execução do PDP.
Com a atual legislação, foi incluída a participação da Secretaria de Gestão e Desempenho de Pessoas (SGP) com a função de aprovação e fiscalização da execução do PDP. À SGP compete também padronizar o PDP por meio de sistema eletrônico, detendo a centralização do processo e retirando a autonomia formativa das IFES, para definir áreas prioritárias para um público específico de acordo com as demandas de seus servidores.
O D 9991 de PR (2019) integra conceitos de ações transversais (comuns a servidores em exercício em mais de um órgão) e atribuiu competência à ENAP de executar essas ações visando otimização de recursos financeiros.
Ainda, o D 9991 de PR (2019) permite à instituição estabelecer o quantitativo máximo de servidores que poderão usufruir simultaneamente da Licença para Capacitação limitados a 5% de servidores em exercício, tornando o processo burocrático, bem como inviabilizando o acesso.
Com relação ao afastamento para participação em programa de pós-graduação stricto sensu, o atual decreto prevê necessidade de processo seletivo, conduzido e regulado pelo SIPEC engessando ainda mais o processo do requerente.
A normativa no seu Art. 20, define que afastamentos poderão ser interrompidos, a qualquer tempo, no interesse da administração gerando insegurança no servidor. As atuais regras tendem a desmotivação devido às dificuldades em ingressar em programas de desenvolvimento podendo acarretar na falta de profissionais desenvolvidos, capacitados e motivados para exercer a função.
5. Considerações finais
Ao retomar o objetivo do estudo, vê-se que o caminho metodológico percorrido corroborou na identificação dos principais achados da pesquisa. Dentre eles, desafios e resistências iniciais à mudança regulatória, todavia acenando para a modernização da Gestão de Pessoas nas universidades federais brasileiras, bem como para a valorização e desenvolvimento dos servidores do ambiente institucional.
Os participantes da pesquisa revelaram opiniões convergentes e divergentes sobre a temática apresentada. Por meio dos discursos de entrevistados, observou-se o atual contexto de imposição e controle por parte do Governo Federal principalmente na relação de autonomia universitária.
A Gestão por Competência é tema habitualmente debatido na área de Gestão de Pessoas especialmente na iniciativa privada, todavia, sua concepção tem sido aplicada ao serviço público. Muitos são os entraves observados majoritariamente por conta do caráter político das decisões. No entanto, os decretos, como ferramentas, possibilitam a aplicação de teorias empresariais à realidade do setor público considerando diferenças entre esferas e cenários.
O presente estudo revela a importância de estreitar relações entre tomadores de decisão e potenciais servidores que executam as ações, otimizando recursos e possibilitando o melhor aproveitamento da Gestão de Pessoas por Competências em IFES.
No cenário observado, há evidências de mudanças em ações de gestores e geridos quando se alterou a normativa visto que não se considerou prévia consulta com interessados. Como resultado, o engessamento e limitação de ações. Como condicionante, pandemia global do Coronavírus influenciando direta e indiretamente atividades das instituições analisadas.
Segundo discursos, foi identificada a falta de instrumento que permita medir com exatidão necessidades de capacitação, bem como a ausência de um processo de Gestão de Pessoas que possibilite seguir as regras do decreto são demandadas.
Por fim, destaca-se que a principal contribuição do presente estudo foi a possibilidade de analisar dois regramentos que influenciam a gestão de pessoas no setor público brasileiro, tanto de maneira teórica quanto da sua aplicação prática, evidenciando os pontos em que houve melhora e os que implicaram dificuldades às Instituições.
Os sujeitos da pesquisa destacam como sugestão a futuros estudos a proposição de um modelo padronizado para a identificação de necessidades de capacitação às IFES, oportunizar a participação de outras, como também analisar o cenário sob uma perspectiva de retomada das ações previstas no D 9991 de PR (2019), pós-pandemia, em que gestores e usuários poderão realizar avaliações mais profundas sobre a sua eficácia, eficiência e efetividade institucional.
Declaración de conflictos de interés
No declaran.
Contribución de cada autor
Monica Scoz Mendes participó de la conceptualización del trabajo, el diseño de la metodología, la curación de datos y el análisis de la información, la visualización, redacción y revisión del trabajo publicado.
Noemia Salete Wismann participó de la conceptualización del trabajo, el diseño de la metodología, la curación de datos y el análisis de la información, la visualización, redacción y revisión del trabajo publicado.
Francielly Santos Teixeira participó de la conceptualización del trabajo, el diseño de la metodología, la curación de datos y el análisis de la información, la visualización, redacción y revisión del trabajo publicado.
Marcos Baptista Lopez Dalmau es responsable de la coordinación y ejecución de la actividad investigadora. Participó de la conceptualización del trabajo, el diseño de la metodología, la curación de datos y el análisis de la información, la visualización, redacción y revisión del trabajo publicado.
Kelly Cristina Benetti Tonani Tosta es responsable de la coordinación y ejecución de la actividad investigadora. Participó de la conceptualización del trabajo, el diseño de la metodología, la curación de datos y el análisis de la información, la visualización, redacción y revisión del trabajo publicado.
Uso de inteligencia artificial generativa (IAG)
Los autores declaran no haber empleado herramientas de IAG en la elaboración del presente trabajo.
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2025 por los autores; licencia otorgada a la revista Escritos Contables y de Administración. Este artículo es de acceso abierto y distribuido bajo los términos y condiciones de una licencia Atribución-No Comercial 4.0 Internacional (CC BY-NC 4.0) de Creative Commons. Para ver una copia de esta licencia, visite https://creativecommons.org/licenses/by-nc/4.0/
1 Faculdade de Administração, Universidade Federal de Santa Catarina. Brasil. E-mail: monica.scoz@ufsc.br. ORCID: https://orcid.org/0000-0002-3671-385X.
2 Faculdade de Administração, Universidade Federal de Santa Catarina. Brasil. E-mail: noemiaw@gmail.com. ORCID: https://orcid.org/0000-0002-1840-6354.
3 Faculdade de Administração, Universidade Federal de Santa Catarina. Brasil. E-mail: professordalmau@gmail.com . ORCID: https://orcid.org/0000-0002-8620-1625.
4 Faculdade de Administração, Universidade Federal da Fronteira Sul. Brasil. E-mail: kellytosta@uffs.edu.br. ORCID: https://orcid.org/0000-0003-0531-5282.
5 Faculdade de Administração, Universidade Federal de Santa Catarina. Brasil. E-mail: frann.teixeira.86@gmail.com. ORCID: https://orcid.org/0000-0002-3374-4765.